VENEZUELA - Os venezuelanos votaram a favor das intenções do governo do presidente Nicolás Maduro de anexar o território do Essequibo, controlado pela vizinha Guiana, anunciou o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela.
"Foi uma vitória clara e esmagadora do sim no referendo consultivo sobre o Essequibo", afirmou no domingo (03/11) o presidente do CNE, Elvis Amoroso, sublinhando que a consulta popular registrou mais de 10 milhões de votos.
O CNE não explicou se o número de 10.554.320 "votos" corresponde ao de eleitores que compareceram às urnas ou ao somatório dos cinco votos que cada eleitor tinha de dar, pois o referendo tinha cinco perguntas. A imprensa local noticiou que houve uma baixa afluência de eleitores ao longo do dia de votação.
Segundo o CNE, 95,93% dos "votos" foram a favor da "criação do Estado de Guiana Essequibo e do desenvolvimento de um plano acelerado para o atendimento integral da população atual e futura desse território, incluindo, entre outros, a concessão da cidadania venezuelana e de carteiras de identidade, em conformidade com o Acordo de Genebra e o Direito internacional, incorporando assim esse Estado no mapa do território venezuelano", enquanto 4,07% foram contra. Os resultados já eram esperados.
Maduro anunciou ainda no domingo que a Venezuela iniciará agora uma nova etapa na defesa do território do Eseequibo, mas sem dar mais detalhes. "O povo falou alto e claro e vamos iniciar uma nova e poderosa etapa, porque temos o mandato do povo, temos a voz do povo", disse. Com o referendo, o governo da Venezuela busca fortalecer uma reivindicação centenária sobre esse território rico em petróleo e sob controle da Guiana. "O Essequibo é nosso" é o slogan repetido em murais e canções diante desse processo, no qual 20,7 milhões de venezuelanos (de uma população de quase 30 milhões) foram chamados a votar.
A consulta em torno dessa disputa histórica ocorre dois dias depois que a Corte Internacional de Justiça (CIJ), com sede em Haia, determinou que Caracas se abstenha de interferir no atual status do território, vigente desde 1966.
Caráter não vinculativo
A consulta não vinculativa não tratava de autodeterminação, uma vez que este território de 160 mil quilômetros quadrados está sob a administração da Guiana e os seus 125 mil habitantes não tomam parte da votação.
O resultado não terá consequências concretas a curto prazo: a Venezuela procura reforçar a sua credibilidade e justificar a sua reivindicação e negou que esteja procurando desculpa para invadir e anexar à força a área, como temem os guianenses.
"Temos que buscar justiça pela desapropriação que nos fizeram da Guiana Essequiba, haverá justiça se houver uma voz unida do povo", disse o presidente Nicolás Maduro no sábado, durante um evento religioso convocado por ocasião da consulta.
Os argumentos da Venezuela
A Venezuela argumenta que o rio Essequibo é a fronteira natural, como era em 1777, quando ainda era a Capitania Geral do Império Espanhol. O país cita o Acordo de Genebra, assinado em 1966, antes da independência da Guiana do Reino Unido, que lançou as bases para uma solução negociada e anulou uma sentença de 1899, defendida pela Guiana.
O Acordo de Genebra de 1966 – que a Venezuela defende – buscava uma solução política viável e eficaz para o conflito, ao mesmo tempo em que admitia a existência da disputa sobre as fronteiras desenhadas em 1899. Mas as negociações se arrastaram sem resultados e, após esgotados todos os procedimentos, a ONU encaminhou o caso à CIJ, também por insistência da própria Guiana.
A Venezuela sempre considerou o Essequibo como seu, porque a região fazia parte do seu território durante o período colonial. Mas a reivindicação se intensificou a partir de 2015, com a descoberta de grandes reservas de petróleo na costa do Essequibo pela americana ExxonMobil – equivalente, segundo estimativas, a cerca de 75% da reserva brasileira de petróleo.
Entre as perguntas do referendo do domingo havia uma sobre o apoio à concessão da nacionalidade venezuelana aos 125 mil habitantes do Essequibo e à incorporação do território de 160 mil quilômetros quadrados – 74% da Guiana – "ao mapa venezuelano".
Lula apela por bom senso
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse neste domingo em Dubai que espera bom senso da Venezuela e da Guiana para resolver o litígio entre os dois países sobre a região do Essequibo. "O que a América do Sul não está precisando é de confusão", disse Lula em seu último dia na COP28 antes de embarcar para Berlim, onde começa neste domingo uma visita oficial.
"Não se pode ficar pensando em briga. Espero que o bom senso prevaleça, do lado da Venezuela e do lado da Guiana", acrescentou.
Lula lembrou que conversou com os presidentes dos dois países e comentou que o referendo provavelmente teria o resultado pretendido pelo presidente venezuelano, Nicolás Maduro.
Questionado se tem medo de uma guerra entre as duas nações, ele respondeu que "a humanidade deveria ter medo da guerra" e defendeu a necessidade de um diálogo. "Se tem uma coisa que estamos precisando para crescer e para melhorar a vida do nosso povo é a gente baixar o facho, trabalhar com muita disposição de melhorar a vida do povo, e não ficar pensando em briga, não ficar inventando história", ressaltou.
Diante da escalada de tensão, o governo brasileiro enviou mais 60 soldados das Forças Armadas para reforçar o contingente de 70 homens na fronteira. O estado de Roraima tem fronteira com a Venezuela e com a região do Essequibo.
por dw.com
VENEZUELA - A Venezuela convocou um referendo consultivo sobre o disputado território do Essequibo, que propõe a criação de um estado (província) naquela região e a nacionalização de seus habitantes. A Guiana, por sua vez, considera o plano "ilegal" e apela à "resistência".
A proposta de referendo surgiu em setembro no Parlamento, em meio à tensão pelas licitações petrolíferas feitas pela Guiana em áreas marítimas pendentes de delimitação.
A consulta, classificada como "política" por especialistas, será realizada em 3 de dezembro, e pode acabar fragilizando a posição da Venezuela na disputa, que está sendo julgada no Tribunal Internacional de Justiça (CIJ, na sigla em francês).
"Interesses vitais, como a soberania e a integridade territorial, geralmente não são consultados porque existe o risco de um voto contra", explicou à AFP o ex-vice-chanceler Alejandro Flemming.
Neste sentido, "um resultado adverso seria simplesmente inconstitucional", alerta o advogado constitucionalista Juan Rafalli. "É obrigação do Presidente da República e dos órgãos de segurança defender a soberania", completou.
O Essequibo, um território de 160.000 km² rico em minerais e biodiversidade, é administrado pela Guiana e reivindicado pela Venezuela em uma disputa centenária.
A Venezuela reivindica o Acordo de Genebra, firmado em 1966 com o Reino Unido, antes da independência guianesa, que estabelecia bases para uma solução negociada e desconhece os limites estabelecidos em um parecer anterior de 1899 firmado em Paris, que é defendido por Georgetown.
A disputa territorial centenária foi retomada em 2015, quando a petrolífera americana ExxonMobil encontrou jazidas de petróleo.
- Principais questões -
O referendo consultivo, não vinculante, possui cinco questões, que abordam o apoio ou a rejeição de ambas as sentenças, e também questiona sobre ignorar a jurisdição do CIJ, embora o governo já a reconheça.
O ponto cinco se refere à "criação do estado Guiana-Essequiba" e o desenvolvimento de "um plano acelerado para a atenção integral à população atual e futura desse território", que inclua a concessão de cidadania venezuelana.
Até o momento, essa região disputada é identificada no mapa como uma "área em reivindicação".
Georgetown classificou a questão como "perniciosa" em um comunicado. "O confisco do território da Guiana constituiria um crime internacional de agressão" e apelou em declarações para a "resistência".
Mark Kirton, professor de Relações Internacionais em Georgetown, destaca que já viu o conflito aumentar antes, "mas desta vez foram mais longe. Estão falando em anexação".
- Participação -
Além dos "assuntos vitais", Flemming destaca a importância da participação nesta convocação, que é carregada de alto conteúdo político.
"Se as pessoas não votarem ou votarem contra, seria muito delicado porque, embora seja consultivo e o seu cumprimento não seja obrigatório, enviaria um sinal muito negativo", afirma o professor universitário, reconhecendo que 75% representaria uma participação ideal para que não houvesse dúvida de que as pessoas são a favor da reivindicação do Essequibo.
Para Rafalli, o referendo serve para "demonstrar a capacidade de mobilização e despertar o nacionalismo" um ano antes das eleições presidenciais.
O Estado ao qual propõe o referendo implica a "posse do território", ressalta Rafalli. "Esse estado de Essequibo é onde chegaremos no dia em que pudermos tomar plenamente a soberania venezuelana naquele território que está sendo reivindicado", completou.
Uma invasão parece descartada, embora ambos os países mantenham suas linhas de defesa.
"Não podemos lutar contra a Venezuela. Somos um país pequeno, com recursos limitados, sem um grande Exército (...), temos que trabalhar para manter o apoio diplomático", analisou Kirton.
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